quarta-feira, 13 de julho de 2011

Sinistro de Transporte – Fraude - Como você liquidaria este caso?

Apresentamos à sua análise uma ocorrência de sinistro que nos foi submetida à apreciação há alguns anos, para opinar acerca da decisão da Seguradora.

Ao final perguntaremos qual é a sua opinião sobre o assunto.

Um lote de rodas para veículos de passeio estava sendo transportada por uma carreta de uma unidade da fábrica para outra unidade dela própria, em ato de Transferencia de Estoque.

Quando estava distante aproximadamente a apenas 5 Kms do local de destino, o veículo transportador tombou às margens da estrada em que trafegava.

O motorista ausentou-se momentaneamente do local, deixando a carga sem vigilância, para avisar por telefone o Gerente da Transportadora, pessoa essa que estava substituindo o proprietário de tal Empresa que estava viajando em férias.

O mencionado Gerente lhe disse que rapidamente enviaria 2 veículos de menor porte para receber a carga sinistrada em transbordo, já que não havia nenhuma carreta disponível.

Em seguida, o motorista também comunicou a ocorrência à Seguradora através de linha 0800, informando que já providenciara o resgate.

Por sua vez, a Seguradora acionou o Comissário de Avarias credenciado mais próximo do citado local, para apurar a natureza, a causa e a extensão dos prejuízos.

Durante a ausência do motorista, ocorreu que alguns usuários daquela estrada, como também alguns moradores ou transeuntes, saquearam 1/3 da carga.

O Vistoriador compareceu ao local, onde havia apenas vestígios do acidente, tendo sido informado por moradores locais acerca do saque e de que a carga remanescente havia sido transbordada para 2 veículos menores, os quais foram conduzidos carregados às dependências da Transportadora.

Ele dirigiu-se até lá, onde entrevistou o motorista, que foi dispensado em seguida.

Entrevistou, ainda, o Gerente, que lhe mostrou simplesmente 1 dos 2 veículos de resgate.

Sobre a carroceria havia 1/3 da carga originalmente transportada.

O Gerente informou que lamentavelmente os restantes 2/3 da carga haviam sido saqueados por populares e usuários da estrada e que a quantidade resgatada seria enviada no dia seguinte à Fábrica, para apuração da eventual existência de avarias nas rodas que impedissem a sua utilização comercial.

Acrescentou que providenciaria o registro policial da ocorrência.

Estranhando a divergência de informações quanto a ser 1 ou 2 veículos de socorro e salvamento, principalmente porque a quantidade que lhe fora mostrada pelo Gerente era pouca em relação ao total embarcado, o Vistoriador retornou ao local do acidente, onde entrevistou várias pessoas e colheu depoimento escrito de algumas testemunhas de que foram realmente utilizados 2 veículos e não 1 no resgate de 2/3 da carga original, contrariando a versão do Gerente.

De volta à Transportadora, ele questionou o Gerente a respeito, para esclarecer sua dúvida.

Demonstrando tranquilidade, o Gerente confirmou que realmente foram utilizados 2 veículos, mas que a carga que ambos resgataram foram reunidas em apenas 1 deles nas dependências da Transportadora, já que, quando fizeram a operação, tais veículos estavam parcialmente carregados com outras mercadorias, já despachadas aos respectivos destinos, de forma que naquele momento do resgate não tinham disponível toda a sua capacidade de espaço físico e de peso.

Uma explicação aparentemente plausível, mas que não convenceu o experiente Comissário que suspeitou tratar-se de fraude.

O Comissário, então, ao relatar suas apurações e conclusões à Seguradora, foi instruído por ela a obter uma cópia do Boletim de Ocorrencia Policial com o Gerente e, em se confirmando o registro de sua versão sobre o fato, deveria comparecer à Delegacia correspondente para relatar ao seu Titular a sua suspeita e requerer a instauração de Inquérito, a fim de que fosse apurada a verdade sobre a real extensão dos prejuízos.

Na investigação originada pelo Inquérito, a Policia descobriu que tanto o motorista envolvido no evento quanto o Gerente haviam desviado a parte da carga resgatada pelo 2º veículo e que, aliás, já a haviam vendido a diversas pessoas, algumas identificadas e que já haviam revendido os produtos, resultando no indiciamento dos 2 por Crime de Apropriação Indébita e fraude.

Quem comprou e foi identificado também foi indiciado por receptação.

A Fábrica condenou à destruição todo o lote resgatado que lhe foi devolvido, tendo em vista que foram descobertas em algumas das rodas a existência de trincas somente percebiveis após os necessários testes com líquido penetrante em spray, de modo que, sendo Itens de Segurança, não poderia fazer a sua liberação para a posterior venda ao consumidor.

Felizmente, o Art. 18, Parágrafo 6º, do Código de Defesa do Consumidor prevê a não comercialização de produtos em tal situação.

A transportadora ressarciu a fábrica pelos prejuízos havidos em conseqüência do sinistro e, em seguida, pleiteou à Seguradora o pagamento da indenização.

Convicta, julgando que o princípio da boa fé que deve nortear o Contrato bilateral de Seguro não fora respeitado pelo seu Cliente, a Seguradora negou o pagamento integral da indenização pretendida pela Transportadora, na forma de reembolso, alegando tratar-se de má fé por parte dela!

Além disto, comunicou que não renovaria a Apólice de Seguro Obrigatório de RCTR-C, cuja vigência estava em iminente expiramento.

Como é sabido, má-fé ou dolo é qualquer ato consciente por meio do qual alguém induz, mantém ou confirma outrem em erro; vontade conscientemente dirigida com a finalidade de obter um resultado criminoso.

O Contrato de Seguro prevê que a indenização não será devida em caso de dolo:

“I - dolo em ato praticado, exclusiva e comprovadamente, pelo segurado ou beneficiário do seguro, ou pelo representante de um ou de outro; se o segurado for pessoa jurídica, a exclusão se aplica aos sócios controladores da empresa segurada, aos seus dirigentes e administradores legais, aos beneficiários, e também aos representantes de cada uma destas pessoas;”

O Gerente era representante do proprietário que estava ausente da Empresa em gozo de férias e, portanto, era seu dirigente e a administrava na ocasião, mas não era sócio e sim funcionário!

Inconformado, ao invés de consultar a opinião de 1 ou até 3 Reguladores de Sinistros de Transportes, objetivando insistir em uma alternativa lógica para resolver o problema, e entendendo ter esgotado as tratativas no âmbito amigável com a Seguradora, inclusive contando com o auxilio do Corretor do Seguro, o proprietário da Transportadora apelou ao que enxergava ser o último recurso - e ainda não era – a sobrecarregada esfera judicial.

Ele ajuizou Ação contra a referida Seguradora, pleiteando o pagamento da indenização que acreditava lhe ser de pleno direito, argumentando que:

1 - o exagero de má fé nas perdas provocadas pelo sinistro ocorreu por conta exclusiva da atitude ilegal do Gerente e do motorista, seus funcionários, já demitidos, e que a Empresa Transportadora não poderia ser penalizada, porque não participou do ato criminoso deles, sendo inclusive vítima no episódio, conforme a conclusão do Inquérito; e

2 - Na citada Ação, o proprietário argumentou ainda que a Fábrica condenou à destruição todas as Rodas sinistradas devolvidas, parte delas porque apresentou as trincas e parte por justo receio, por serem Itens de Segurança, no que tinha razão, cremos.

Entendia que, independentemente da atitude reprovável de seus funcionários, cujo crime foi apurado em Inquérito e objeto de indiciamento para responderem na Justiça, com certeza a Fábrica determinaria a Perda Total dos produtos envolvidos no acidente havido com o veículo que os transportava.

De fato, neste aspecto, o proprietário tinha razão, pois não pactuou com seus funcionários, não se beneficiou e, afinal, o Departamento de Controle de Qualidade de qualquer Fábrica não libera produtos alvo de dúvida quanto à qualidade.

Basta ver que algumas delas têm que fazer recall para substituir partes e peças que apresentam problema de segurança nos veículos que fabricou, um transtorno evitável no caso.

Perguntamos, pois, ao Leitor:

1 - Você não indenizaria o Segurado-Transportador?

2 – Você indenizaria simplesmente parte dos prejuízos, por avaria (1/3) e saque (1/3), excluindo aquelas mercadorias desviadas e não recuperadas (1/3), as quais a Fábrica faria a condenação se lhe fossem devolvidas também?

Ou

3 – Você indenizaria integralmente o Transportador, aceitando seus argumentos retro-citados?

Sem querer influenciar em sua opinião, veja que quando fosse renovar o Seguro de RCTR-C, que é Obrigatório, o histórico desse sinistro poderia implicar na recusa do risco por parte de qualquer Seguradora, se a ela fosse dado conhecimento do que ocorreu sob a ótica da Seguradora envolvida.

Imaginando que a ocorrência com as características narradas teria sido a primeira na experiência demonstrada pelo Seguro durante a vigência da Apólice, indagamos também se é justa a punição, momentânea ou continua, no sentido de o Transportador não conseguir contratar Seguro no Brasil, por sinal Obrigatório.

Se qualquer Transportador não possuir o Seguro de RCTR-C ou até também o de RCF-DC qual Embarcador o contratará?

O proprietário terá que encerrar as atividades de sua Empresa e abrir outra Transportadora, tentando contornar o problema?

O bom senso deve prevalecer por quem faz a Regulação do Sinistro e por quem faz a sua liquidação.
Antes de negar o pagamento de alguma indenização, deve-se analisar todas as alternativas, incluindo a possibilidade de, em Juízo, o Segurado conseguir reverter a decisão da Seguradora.
Nesse aspecto, claro, a Seguradora é soberana para decidir se deve ou não indenizar, assumindo as conseqüências de sua atitude, evidentemente.

No entanto, como as decisões são adotadas por pessoas e elas podem mudar de opinião, dependendo da argumentação que lhes são apresentadas, não temos qualquer dúvida de que um Regulador de Sinistros, se consultado, contribuiria para o sucesso da reclamação!

Afinal, ao realizar o seu trabalho, ele habitualmente não se baseia em circunstâncias e probabilidades infundadas, mas em fatos, juntando ao seu Relatório os comprovantes de suas apurações e conclusões, como por exemplo, procurou fazer o Vistoriador que atuou no caso, comprovando a sua suspeita de que parte da carga havia sido desviada pelo Gerente e pelo motorista, cometendo uma fraude contra o Seguro, cabendo à Policia apurar a possível conivência ou não do proprietário da Transportadora, o que não se confirmou.

Um comentário:

  1. Olá!
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